Uma explosão destruíu o barco. Cada qual agarrou-se ao primeiro destroço flutuante que lhe chegou às mãos. Cinco acabaram por se encontrar reunidos sobre um destroço que as ondas levaram à deriva. Dos outros companheiros de viagem nenhuma notícia.
Depois de horas, de longas horas a escrutar o horizonte: Será que algum navio em rota por estas andanças do oceano os aperceberá? Irá a jangada de sorte dar à alguma paragem hospitaleira?
De repente, um grito ressonante: Teerrrra! terra à vista! olhai'! olhai para ali! olhi precisarnente na direcção para onde nos levam as vagas!
A medida que se desenha o contorno da costa os rostos enchem de alegria
Eles são cinco, cinco canadianos:
Francisco, o grande e vigoroso é carpinerteiro, foi o que primeiro lançou o grito: Terra!; Paulo, é aquele que vocês vêm em primeiro plano na jangada, à esquerda, de joelhos com uma mão no chão e a outra no mastro, é cultivador;
Tiago, especializado na criação de animals, é o homem de calças ás riscas que de joelhos na jangada olha em direcção à terra;
Henrique, é horticultor agrônomo, um pouco corpulento, sentado sobre uma mala rescapada do naufrágio;
Tomás, é prospector mineiro, é o moço vigoroso que está de pé, atrás do carpinteiro, com uma mão no ombro deste.l
Repor os pés em terra firme, é para nós humanos um regresso à vida.
Uma vez secos e aquecidos a primeira ânsia é a de fazer o reconhecimento desta ilha para onde eles foram atirados longe da civilazação. Ilha que eles baptizaram Ilha dos Náufragos.
Uma rápida excursão à volta à ilha encheos de esperança. A ilha não é um deserto árido. Eles constatam que são os unicos habitantes ali presentes. Outrora porém, ela fôra habitada por outra gente a julgar pelos vestígios de hordas de animais domésticos nela vivendo, Tiago o criador de gado afirma poder tirar um bom rendimento.
Quanto ao solo da ilha, Paulo acha-o em grande parte muito propício à agricultura Henrique descobriu numerosas arvores de fruto e espera tirar delas bom proveito.
Francisco deparou principalmente com a bela extenção de floresta, rica em madeira de várias espécies: será como uma brincadeira cortar árvores para construir casas para a pequena colónia.
Quanto a Tomás o prospector, o que mais o interressou foi a parte mais rochosa da ilha. Notou com grande interesse sinais indicativos da presença de vários minerais. Apesar da falta de ferramenta adequada, Tomás sente-se capaz e expedito de poder transformar esses minerais em metais úteis a todos.
Cada um poderá então dedicar-se às suas tarefas favoritas para o bem commum. Todos são unanimes em louvar a Providência pelo final feliz do trágico incidente.
Eis os móssos amigos com as mãos à obra.
As casas e cs moveis são assunto do carpinteiro. Nos primeiros tempos a gente contentouse de alimentos primitivos. Mas bem depressa os campos produziram e o horticultor obteve boas colheitas.
À passagem sucessiva das estações o património da ilha se enriquece. Enriquece nao de ouro, não de notas impressas mas sim de verdadeiras riquezas de coisas que nutrem, que vestem, que hospedem e acomodam, que satisfazem as verdadeiras necessidades.
A vida porem não é assim tão doce como eles o desejariam, Faltam-lhe certas comodidades a que estavam habituados quando viviam na civilização. Mas sua sorte poderia ter sido bem pior.
Além disso, eles já passaram tempos de crise no Canada- Eles lembram-se das privações sofridas então que as lojas estavam repletas, a dois paços de suas portas- Ao menos na Ilha dos Náufragos ninguém os obriga a ver apodrecer à sua vista, coisas que eles necessitam. Taxas e impostos são inexistentes. Confiscações e vendas em leilão, não são a temer.
Se por vezes o trabalho é árduo, ao menos têm odireito de usufruir dos frutos do seu trabalho. Sobretudo explora-se a ilha a louvar a Deus, esperando que um dia se possam rever parentes e amigos com dois grandes bens conservados: a vida e a saúde.
Nossa gente reune-se frequentemente por causar dos seus negócios.
No sistema económico bem simples, por eles praticado uma coisa os preocupa cada vez mais. Não têm qualquer espécie de moeda currente. A troca, o câmbio livre e directo de produtos por produtos tem os seus inconvenientes. Os produtos ao serem trocados não estão sempre à face um do outro, quando da transação. Por exemplo, a madeira usada pelo agricultor no inverno so poderá ser reembolsada por bens alimentares depois de algum tempo. isto e, no tempo das colheitas, em seis meses.
Por vezes também, um artigo de grande dimensão entregeue de uma vez por um dos homens, e que ele queira em troca diferentes pequenas coisas produzidas por diversos deles em épocas diferentes.
Tudo isto complica os negócios. Se houvesse dinheiro em circulação cada qual venderia os seus produtos por dinheiro. Com o dinheiro apurado nas vendas compraria aos outros as coisas que quer e quando quer e que sejam disponiveis.
Todos estão de acordo quão cómodo seria um sistêma monetário. Mas nenhum d'entre eles sabe como estabelecer um. Eles aprenderam a produzir a verdadeira riqueza, as coisas, mas eles não sabem establecer o valor destas riqezas, o dinheiro.
Eles ignoram como o dinheiro começa e como o iniciar, quando o não há e quando se decide conjuntamente de o haver.. Muitos homens instruidos ficariam sem dúvida também embaraçados.
Todos os nossos governos o estiveram dez anos antes da guerra. Só o dinheiro faltava, no país, e o governo ficava paralizado confrontado com o problema.
Um dia ao pôr do sol, nossos homens sentados a beira da costa retomam o problema pela centésima vez, quando subitamente deparam com um bote remado por um homem só.
Correm para ele para ajudar o seu ocupante, e oferecer os primeiros socorros. A gente cavaqueia...
Oriundo de algures na Europa, o novo habitante da ilha chama-se Martinho.
Felizes por terem mais um companheiro, os nossos cinco homens acolhem-no com muito entusiasmo e fazem-no vistar a ilha.
-"Embora perdidos no meio do oceano, lonnge du resto do mundo, eles não são de muitas queixas. A terra rende bem e a floresta também. Uma única coisa nos faz falta: nós não temos moeda para nos facilitar a troca de nossos produtos."
-"Bendigam o acaso que me trouxe até vóss, responde Martinho. O dinheiro não tem mistérios para mim. Eu sou banqueiro e eu posso instalar um sistema monetário, em pouco tempo e que vos dará plena satisfação. "
Um banqueiro!... um banqueiro!..., um anjo vindo direitinho do céu não teria inspirado mais reverência. Não estamos nós habituados, em país civilizado a nos inclinarmos perante "Suas Excelências" os banqueiros, os quais controlam as pulsações da finança?
-"Senhor Martinho, já que sois banqueiro vós não trabalhareis na ilha vós vos ocupareis sómente do nosso dinheiro."
-"Eu cumprirei com satisfação, como todo o bom banqueiro de forjar a prosperidade comum."
-"Senhor Martinho, nós vos construiremos uma moradia digna de vós. Entretanto, contentar-vos-ias de residir no edifio que serve às nossas reuniões publicas?"
-"Ora bem meus caros senhores, comecemos por descarregar do bote a bagagem que pude salvar do naufrágio: Uma máquina impressora, papel e acessórios, e sobretudo um pequeno barril que tratareis com muito cuidado."
Depois de tudo descarregado, o pequeno barril desperta a curiosidade de nossos bravos homens.
-"Este barril declara Martinho é um tesouro sem igual ele está repleto de ouro."
Cheio de ouro! as cinco almas ameaçavam escapar-se dos cinco corpos tal a sua admiração. O deus da civilazação entrava assim na Ilha dos Náufragos. O deus amarelo, sempre escondido, mas poderoso, terrível, onde a presença, a carência, ou o mais pequeno capricho pode decidir a vida de cem naçoes!
-"Ouro! Senhor Martinho vás sois um banqueiro de verdade. Recebei nossa homenagens e aceitai nossos juramentos de fidelidade."
-"Ouro para enriquecer um continente. Mas não é o ouro que vai circular. É preciso esconder o ouro; o ouro é a alma de todo o dinheiro válido. A alma deve permanecer invísivel. Eu explicar-vos-ei tudo isso, ao vos passar o dinheiro."
À noite antes de se despedir Martinho fez uma derradeira pergunta:
-"Quanto dinheiro será preciso para começar, para que os negócios marchem bem? "
Olham-se entre si curiosos, mas por fim acabam mesmo por humildemente consultar o ilustre Martinho. Com as sugestões do bondoso banqueiro, concordam que 200 dollars a cada um parece ser o suficiente para começar. Reunião marcada para o dia seguinte a tarde.
A gente retira-se, trocando estimulantes reflexões. Deitam-se tarde, não adormecem senão de madrugada, depois de terem sonhado com ouro de olhos abertos.
Martinho, ele não perde tempo, esquece a fadiga não pensando noutra coisa senão nos seus prospectos de banqueiro. Ao romper do dia, ele faz um buraco e enterra o dito barril, meticulosamente, dessimula o local de todo traço de terra remexida.
Depois põe em marcha a sua pequena máquina impressora e imprime mil notas de um dollar. Vendo as notas saindo novinhas de sua impressora, pensa para consigo:
-"Como são faceis de fazer estas notas!, o seu valor porém, provem dos produtos que elas vão servir a comprar. Sem produtos estas notas não valeriam nada. Estes meus ingénios clientes, crêeem que é o ouro que garante o dinheiro. Eu tenho-os seguro pela sua ignorância!"
Ao cair da tarde, os cinco ingenuos checham a correr ao pé de Martinho.
Cinco pilhas de notas lá estavam em cima da mêsa.
-"Antes de vos distribuir este dinheiro é preciso que compreendeis certos promenores."
-"O dinheiro é baseado no ouro guardado no cofre do meu banco. Portanto o dinheiro é meu..., não fiqueis tristes pois eu vou vos emprestar este dinheiro, e vos o empregareis a vosso grado. Entretanto eu só vos cobrarei os juros. Visto que o dinheiro em circulação é raro, ele é mesmo inexistente, eu creio ser razoavel pedir um pequeno juro de 8 por cento ao ano sómente."
-"Vós sois de facto muito generoso!"
-"Um último ponto meus amigos: antes de receberes o dinheiro cada um de vós vai assinar este documento, é um compromisso pelo qual cada um de vos se compromete de pagar juro e capital, sob pena de confiscaçào de vossas propriedades. Oh! uma simples garantia. Eu não tenho a menor intenção de me apropriar de vossas propriedades. Eu contento-me simplesmente do dinheiro, e estou plenamente seguro que vós conservareis os vossos bens e vás me devolvereis o dinheiro e me pagareis o juro."
-"É de muito bom senso, Senhor Martinho, nós redobraremos de ardor no trabalho e tudo reembolsaremos."
-"E é tudo- Vinde a ver-me, se porventura surgir algum problema. O banqueiro é o melhor amigo do mundo... Agora aqui estão os 200 dollars."
E lá foram os cinco amigos, radiantes com as piastras nas mãos e no pensamento.
O dinheiro de Martinho circula na ilha. As trocas simplificando-se, multiplicam-se. Toda a gente se rejubila e sauda Martinho com respeito e gratidão.
Contudo, o prospector anda inquieto. Os seus produtos estão ainda sob a terra. Já não lhe restam senão algumas plastras no bolso. Como reembolsar o banqueiro no próximo pagamento?
Depois de muito refletir sobre o problema, Tomás aborda-o socialmente.
"Tendo em conta a população da ilha, interroga-se, seremos nós capazes de respeitar os compromissos? Martinho criou no total 1000 dollars, mas ele pede-nos uma soma total de 1080 dollars. Se juntássemos o dinheiro todo em circulação na ilha daria um total de 1000 dollars. Ninguem criou os 80 dollars que faltam. Nós fazemos os produtos e não o dinheiro, Martinho poderá então, apropriar-se de todo o patrimonio da ilha, pois todos juntos não poderemos nunca reembolsar a soma total, capital e juros.
"Se aqueles que são capazes de pagar, por eles mêsmos sem se emportar dos outros, alguns vão cair brevemente, os outros sobreviverão simplesmente, mas o tempo deles tambem esta contado. Portanto mais cedo ou mais tarde todos cairão nas maos do banqueiro, que se apoderará de tudo. E melhor nos unirnos de seguida e regularizar o problema socialmente."
Tomás não encontra dificuldade em convencer os outros que o banqueiro os enganou. Concordam com uma reunião geral com o banqueiro.
Martinho adivinha a situação, mas não se desconcerta, mostra-lhes boa cara na mesma. O impulsivo Francisco apresenta o caso:
-"Como poderemos nós pagar 1080 dollars,, quando não há mais do que 1000 dollars em ciculaçào?"
É o juro meus caros senhores, responde o banqueiro. Não aumentou a vossa produção? pergunta Martinho.
-"Sim aumentou, mas o dinheiro não aumentou. Ora é justamente o dinheiro que vos reclamais e não os produtos. Como é que vós, a única pessoa que pode fazer dinheiro, fizesteis 1000 dollars e nos pedis 1080 dollars. Isso é impossível!"
-"Um momento meus senhores, os banqueiros adaptam-se sempre às condições, para o bem estar público... Eu vou pedir-vos unicamente o pagamento dos juros. Nada mais do que 80 dollars. Vós continuarais a guardar o capital."
-"Vó nos perdoais a dívida?"
-"Não. Eu lamento, mas um banqueiro não perdoa nunca uma dívida. Vós deveisme todavia todo o dinheiro emprestado. Mas vás não haveis a reembolsar-me que o juro cada ano, eu não vos exigirei o pagamento do capital. Alguns de vós, poderão vir a ser incapazes de pagar mesmo os juros, uma vez que o dinheiro vai de um a outro. Organizai-vos em nação, convenei a um sistêma de colecta, de contribuição. Quer isto dizer, taxar. Vós taxareis mais aqueles que tiverem mais dinheiro, menos os outros. Contanto que me tragam colectivamente o total dos uros, ficarei satisfeito e vossa nação renderá muito."
Nossa gente retira-se, meio-calma meio-pensativa.
Martinho recolhe-se, e a sós conclui:
"O meu plano é bom. Gente trabalhadora, mas ignorante. A sua Ignorância e a sua crédulidade fazem a minha força. Eles queriam dinheiro e eu meti-lhes as correntes, o cativeiro. Cobrirarn-me de flôres enquanto eu os enrolava.
"Oh! grande ‘Mammom’, eu presinto o teu génio de banqueiro amparar-se do meu ser. Tu bem o dissete, ilustre mestre: ‘ue me concedam o controle do dinheiro de uma nação que eu estou me nas tintas de quem faz as suas leis.’ Sou o mestre da Ilha dos Náufragos, porque controlo o seu sistema monetário.
"Eu poderia controlar o universo. O que eu faço aqui, eu Martinho, poderei fazê-lo no mundo inteiro. Se um dia sair desta lihota: saberei como controlar o mundo sem ter ceptro.
"Minha voluptuosidade soberana seria a de espalhar minha filosofia pela cabeça dos cristãos: banqueiros, chefes de indústrias, políticos, médicos, professores, jornalistas,, eles seriam meus criados. A massa cristã se embala melhor na sua escravidão, quando seus capatazes são eles mesmos cristãos."
E toda a estrutura do sistema bancário Mammoniano se desenha no espírito encantado de Martinho.
Entretanto, a situação piora na Ilha dos Náufragos. Nota-se um esforço para o aumento da produtividade, mas constata-se um decréscimo na venda dos produtos. Martinho sorve regularmente os juros- É preciso pensar em pôr dínheiro de. lado para ele. O dinheiro logra, consequentemente circula mal.
Aqueles que pagam taxas mais altas queixam-se dos que pagam menos, e em compensação aumentam o preço de seus produtos. Os mais pobres, os que não pagam taxas, queixain-se por sua parte da carestia da vida e compram menos.
O moral baixa e a alegria de viver abandona-os. Trabalha-se sem convicção. O quê de bom? Os produtos vendem-se mal; e quando eles se vendem é preciso, pagar a taxa a Martinho. A gente priva-se. É a crise. E cada um acusa o seu vizinho de falta de virtude e de ser a causa do alto custo de vida.
Um dia a sós no meio do seu pomar, Henrique concluiu, que o "progresso" trazido pelo sistema monetário do banqueiro estragou tudo o que era bom na ilha. Concerteza, os cinco homens hão os seus defeitos; mas o sistema de Martinho alimenta tudo o que há de mais ignóbil na natureza humana.
Henrique decide de convencer e juntar os seus companheiros para uma reuniâo. Que depressa se faz. Começa por Tiago: "Ah! diz Tiago, eu não sou sábio. mas ja há muito tempo que sinto, que o sistema deste banqueiro, é mais nojento que a bosta no meu estábulo, na primaveral!"
Aplaudindo um após outro, uma nova entrevista com Martinho ficou assim decidida.
Aquilo foi uma barafunda na casa do banqueiro:
-"O dinheiro é escasso na ilha por que vós o tirais de circulação. Nós vos pagamos e pagamos, e vos devemos ainda o mesmo montante que no início. Nós trabalhamos, construímos belas quintas, e eis nos em bem pior situação que à vossa chegada. Dívida! Dívida! Dívida pelas costas!"
-"Vamos lá meus amigos, raciocinemos um pouco. Se vossas terras estão mais bonitas, é graças a mim. Um bom sistema bancário, é o mais belo activo dum país. Mas para profitar dele, é preciso guardar antes de mais nada toda a confiança no banqueiro. Vinde a mim como a um pai... Vás quereis mais dinheiro? Muito bem. O meu barril d'ouro vale bem muitas vezes mil dollars... Olhai! eu vou hipotecar de novo vossas propriedades e vous emprestar em seguida outro milhar de dollars."
-"Duas vezes mais em dívida? Duas vezes mais juros a pagar todos os anos, sem fim?"
-"Sim, mas eu vos emprestarei ainda mais, contanto que vos aumentareis o vosso valor predial; e vós não me devolvereis nada mais que o juro. Vás empilhareis os empréstimos; charmareis a isto dívida consolidada. Dívida que poderá aumentar anualmente. Mas vosso rendimento também. Graças ao meu financiamento, vós desenvolvereis a vossa nação."
-"Então nesse caso, quanto mais fizermos, prosperar a ilha, mais a nossa dívida global aumentará?"
-"Como em todo o país civilizado. A dívida pública é um barómetro da prosperidade."
-"É a isto que vás chamais dinheiro são, Senhor Martlnho" Uma dívida nacional tornando- se necessária e impagável, não e- são, é doentio."
-"Meus Senhores, toda a moeda validá, deve ser baseada em ouro, e sair do banco em dívida. A dívida nacional é uma coisa boa: Ela coloca os governos sob a sabedoria sadia dos banqueiros. A título de banqueiro, sou uma chama de civilização na vossa ilha."
-"Senhor Martinho, nós podemos ser uns ignorantes mas nos não queremos essa civilização aqui Nós não pediremos mais um cêntimo emprestado. Moeda válida ou não, nós não faremos mais negócios consigo."
-"Eu lamento essa vossa decisão precipitada, caros Senhores. Se vás romperdes vossos compromissos comigo, eu tenho as vossas assinaturas. Devolvei-me tudo imediatamente: juros e capital."
-"Mas isso é impossível, senhor Martinho. Mesmo se vos devolvermos todo o dinheiro existente nã ilha não ficaremos quites."
-"Não quero saber. Vocês assinaram? sim ou não? Sim? Ah! bem, então em virtude da santidade dos contratos, eu confiscarei todas as vossas propriedades em penhor tal como convenído entre nós, quando vocês estavam contentes de me terem entre vós. Vós não quereis servir de bom grado a potência suprema do dinheiro, vos a servireis a força. Vós continureis a explorar a ilha, mas para mim e segundo as minhas condições. Ide embora, que eu amanhã vos ditarei as ordens."
Como Mammom, Martinho sabe que aquele que controla o sistema monetário de uma nação, controla essa nação. Mas ele sabe também que para manter essa dominação, é preciso manter o povo na ignorancia, e o entreter com outra coisa.
Martinho notou que entre os cinco insulares, dois são conservadores e três são liberais. Isto transpareceu quando das conversas entre os cinco, sobretudo quando eles se tomaram seus escravos. O rebuliço entre azuis e vermelhos.
De tempos a tempo Henrique menos partidário, sugere uma força no povo para fazer pressão sobre os govemantes... Força perigosa para toda a ditadura. Martinho, vai aplicar-se a envenenar o mais possível as discórdias políticas.
Servindo-se de sua impressora faz aparecer dois folhetins semanários: "O sol", para os vermelhos "A Estrela" para os azuis.
"O Sol" transcreve: Se vás não sois mais mestres em vossas casas é por causa dos atrasados dos azuis, sempre agarrados a seus interesses.
"A Estrela" transcreve: Vossa dívida nacional e obra dos malditos vermelhos, sempre prestes a aventuras políticas.
Os nossos dois grupos políticos guerreiam-se a altos gritos, esquecendo-se do verdadeiro causador do cativeiro, o fiscal do dinheiro, Martinho.
Um dia, Tomás, o prospector, descobre, encalhado ao fundo de uma enseada nos confins da ilha e obstruido por grandes arbustos um bote-salva-vidas, sem remo, sem outro vestígio de serviço que uma caixa muito bem conservada.
Abrindo a caixa: descobre alem de roupa e algumas outras miudezas um livro-album em bom estado que desperta a sua atenção. O livro tem por titulo:
O Primero Ano de "Vers Demain" (Michael Journal)
Curioso, nosso Tomás assenta-se e abre o volume. Lê-o. Devora-o. Ilumina-se:
"Mas eis aqui o que deveríamos ter sabido à muito tempo.
"O dinheiro não tira o seu valor do ouro de maneira nenhuma, mas dos produtos que o dinheiro compra.
"O dinheiro pode ser uma simples contabilidade, os créditos passam de uma conta a outra segundo as compras e vendas. O total do dinheiro em relação ao total da produção.
"A todo o aumento de produção, deve corresponder um aumento equivalente de dinheiro... Nunca juros a pagar sobre o dinheiro nascente... O progresso representa não uma dívida pública mas um dividendo igual a cada um... Os preços, ajustados ao poder de compra por um coeficiente de preços. O Crédito Social..."
Tomás não aguenta mais e corre, com o livro na mão, compartilhar sua esplêndida descoberta com os quatro companheiros.
Tomás instala-se como professor:
"Eis aqui, o que poderíamos ter feito, sem o banqueiro, sem ouro, sem assinar alguma dívida.
"Eu abro uma Conta no nome de cada um de vós. À direita, os créditos, o que acrescenta à conta; à esquerda, os débitos, o que a diminui.
"Nós queríamos para começar, 200 dollars. Num acordo comum, decidemos marcar 200 dollars ao crédito de cada um. Cada um recebe logo 200 dollars.
"Francisco compra artigos a Paulo, por 10 dollars. Eu subtraio 10 dollars a Francisco, restam-lhe 190 dollars. A Paulo acrescento-lhe 10 dollars, ele tem agora 210 dollars.
"Tiago faz compras a Paulo no valor de 8 dollars. Eu suprimo 8 dollars de sua conta ele guarda 192 dollars. Paulo, ele aumenta a 218.
"Paulo compra madeira do Francisco por 15 dollares. Eu subtraio 15 dollars a Paulo, ele guarda 203 dollars, eu adiciono 15 dollars a Francisco, sua conta sobe 205 dollars.
"E por aí fora; duma conta à outra, tudo como notas vão de um bolso a outro.
"Se um de nós tem necessidade de dinheiro para aumentar a sua produção, abre-selhe o crédito necessário, sem juro. Ele reembolsa o crédito uma vez a produção vendida. Mesma coisa para os trabalhos públicos.
"Aumenta-se assim, periodicamente, as contas de cada um de soma adicional, sem nada tirar a ninguem. Em correspodência ao progresso social, o dividendo nacional. O dinheiro é assim um instrumento de serviço."
A pequena nação tomou-se créditista. No dia seguinte o banqueiro Martinho recebe uma carta assinada dos cinco:
"Caro Senhor, vós nos endividaste e exploraste, sem nenhuma necessidade. Nós não precisaremos mais de vós para regir nosso sistêma monetário. Nós de agora em diante teremos todo o dinheiro necessário, sem ouro, sem dívida, sem ladrão. Nós iremos establecer imediatamente na Ilha dos Náufragos o sistema do Crédito Social. O dividendo nacional substituirá a dívida nacional.
"Se vós,estais interessado no reembolsmento do vosso dinheiro, nós poderemos vos devolver todo o dinheiro que vós fizeste para nós, nada mais. Vós não podeis reclamar aquilo que vós não fizeste."
Martinho esta desesperado. É o seu empério que se desmorona. Para os cinco habitantes tornados créditistas, já não há mais mistério sobre o dinheiro ou sobre crédito para eles.
"Que fazer? Pedir-lhes perdão, transformar-se num deles? Eu banqueiro, fazer isso?... Não. Eu vou antes passar sem eles e viver à parte."
Para se protegerem contra toda eventual reclamação, nossos homens decidiram fazer assinar uma declaração ao banqueiro atestando que ele possue todavia todos os bens que ao desembarcar na ilha.
Donde o inventário geral: O bote, a pequena máquina impressora, e o famoso barril de ouro.
Foi preciso que Martinho indicasse o lugar, e a gente desenterra o barril. Nossos homens tiram-no do buraco com muito menos cuidado desta vez. O Crédito Social ensinou-os a desprezar o feitiço do ouro.
O prospector, ao levantar o barril, apercebe-se que para ouro não pese assim muito: "Eu duvido muito que este barril esteja cheio d'ouro", diz ele.
O impetuoso Francisco, não hesita muito tempo. Uma machadada e o barril espalha o seu conteúdo: ouro, nem uma grama! Pedras, nada mais do que simples calhaus sem valor!...
Nossos homens ficam pasmados:
-"Dizer que ele nos mistificou a esse ponto, o miserável' Era preciso ser parvo, tambem, para cair em êxtase perante a palavra OURO!"
-"Dizer que nós lhe havíamos confiado todas as nossas propriedades por pedaços de papel baseados sobre quatro pazadas de pedras! Ladrão e Mentiroso!"
-"Dizer que nós, nos mostramos enfadados e odiado uns aos outros durante mêses a fio por semelhante intrujice! O demónio!"
Mal o Francisco havia levantado o machado, já o banqeiro fugia a sete pernas para a floresta.